Na quinta-feira, 12 de junho de 2025, teve início oficialmente a temporada junina em Belém com o Cortejo Fluvial dos Arrastões do Pavulagem, uma celebração que percorre o Rio Guajará até a Escadinha da Estação das Docas. O momento marcou o “ato de abertura” dos arraiais paraenses, culminando com o levantamento dos mastros de São João na Praça Waldemar Henrique. No final da tarde, o cantor e compositor local Antônio de Oliveira conduziu um show intimista em um boteco aconchegante da Cidade Velha, embalando a noite com sua voz e composições carregadas de regionalidade.
O espetáculo reverenciou as manifestações mais tradicionais da quadra junina amazônica: o cortejo fluvial, os mastros, o carimbó, as rodas de boi e a alegria ribeirinha que pulsa na música e no corpo do povo. Eduardo Silva, um dos mestres do evento, destacou que o momento tornava “a retomada de nossa relação com a cidade-ribeirinha”, ecoando a combinação de devoção, festa e identidade cultural.

Opinião: Em tempos de festividades pasteurizadas, resgatar o Pavulagem é um ato de resistência cultural
Ver Belém reviver essas raízes é mais do que entretenimento: é resistência. A apresentação de Antônio de Oliveira em um boteco da Cidade Velha, longe dos palcos comerciais, foi um respiro em meio à invasão de grandes festivais com repertório padronizado e patrocinadores globais. Aqui, o canto brota das alegrias e das angústias de um povo que segue firmemente ancorado na tradição ribeirinha.
O cortejo fluvial, com seus mastros adornados e as fitas simbólicas, não é apenas uma celebração: é uma reafirmação da cultura amazônica em tempos de apagamento e má representação. O som da banda Arraial do Pavulagem, o canto de carimbó e o sotaque do povo amazônico voltam a ter voz — não como atração exótica num calendário, mas como conteúdo vivo, que pulsa no cotidiano.
Antônio de Oliveira não é um artista coadjuvante: ele encarna essa tradição, dialoga com o passado e reflete sobre a atualidade da floresta, dos rios e da comunidade que o viu nascer e crescer. Ele não canta para a plateia; ele reencena, recorda e renova.
É por isso que o arrastão merece nossa atenção: ele une música, fé, corpo e rios, desafiando a cultura comercial e reafirmando a importância de preservar uma narrativa própria. Em vez de espetacularização vazia, Belém precisa ser palco de suas próprias tradições, reconhecidas em sua potência popular — e nesse resgate silencioso, a quadra junina amazônica encontra sua verdadeira celebração.